27.9.07

Será qu´eles se confundiram?

Acompanhei, com atenção, os minutos finais da derrota alvinegra para o River Plate, faz pouco, em Buenos Aires - e então me ocorreu hipótese assaz honesta e capaz d´explicar o vexame do Botafogo, que consistiu em que, apavorados, seus jogadores, embora contando com dois atletas a mais [sem considerar o árbitro], simplesmente entregassem, nos estertores do match, a classificação [a mais fácil de que se tem notícia na história do futebol] para o adversário rubro-negro. Eis, afinal, a hipótese...

As cores são as mesmas, o patrocinador também... Déjà vu? Será?

De todo jeito, aqui fica a solidariedade tribuneira para com os bons amigos botafoguenses.

São Cosme e Damião - a fé no pé-de-moleque

De pé descalço como ontem e hoje, por favor e sorte, com a licença de Doum e as graças dos ibejis do candomblé - gêmeos amigos das crianças [aqueles qu´agilizam qualquer demanda em troca de doces e guloseimas] -, e sob as sombras d´Igarassu do Pernambuco, celebramos aqui a memória de Cosme e Damião, os santos pobres, os verdadeiros sobreviventes!, senão lembremos o percurso da milagrosa resistência: d´início afogados, foram salvos por anjos; em seguida, ao fogo, queimadura uma não tiveram; depois, apedrejados, viram as pedras voltarem contra quem os atacava, por fim morrendo degolados, qual ilustra, à esquerda, o óleo de Fra. Angelico.

E que vença com a crença quem tem seu axé.

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Leia, no Arquivo de textos do site da Casa, Cosme e Damião, de 25/09/2006.

26.9.07

Discurso multiuso

(...) "É preciso reverter essa lógica aparentemente realista e sofisticada, mas na verdade anacrônica, predatória e insensata, da multiplicação do lucro e da riqueza a qualquer preço". (...)

Bonito, muito bonito... Mas para que platéia o presidente Lula fez este discurso:

- para os inescrupulosos chefes-de-estado primeiro-mundistas presentes na Assembléia Geral da ONU?

- ou para a bandida base aliada no Congresso Nacional, que negocia os cueiros com o governo, desta vez para prorrogar a CPMF?

(Ah, sim, em tempo: o discurso se deu na ONU, em Nova York).

25.9.07

Marcel Marceau [1923-2007]




Morreu sábado, em Paris, o irresistível mímico francês Marcel Marceau, qu´ora homenageio com a lembrança duma apresentação dele aqui no Rio, no Theatro Municipal, durante a qual dormi longa e profundamente.

Qu´ele também, agora, descanse em paz.

Sobre ser [ou não] sambista


Candeia [Antonio Candeia Filho] é a minha definição para sambista. (E haverá quem, com toda a propriedade do mundo, lembre de Paulo da Portela, Mestre Fuleiro, Ismael Silva, Ataulfo Alves, Geraldo Pereira, Marçal, Padeirinho, Neoci de Bonsucesso, Martinho, Luiz Carlos da Vila, Almir Guineto)... Não importa. Todos, humanos, uns mais falíveis qu´outros, todos viveram [e vivem] absolutamente confundidos com o samba, que criaram, tocaram, dançaram, cantaram, às vezes tudo ao mesmo tempo, tudo sempre muito bem. (Presente, futuro e memória). Tudo: sempre.

Escrevo isto a propósito de papo internético mantido nos comentários para a nota Que assim seja, publicada cá neste blogue a 18 de setembro, em qu´a leitora Olga [a Olímpica!] e o tribuneiro fundador Focca discutem a "sacralização" do samba e uma certa patrulha, inegável, definidora de quem seja ou não sambista, tendo como base o novo disco [muito bom] da Maria Rita, que se inicia com um samba dolente em qu´ela, d´alguma maneira, pede licença, respeitosa e reverentemente, para cantar o gênero. (Isto de qu´o Focca não gosta e que Olga e eu, mais do que talvez gostarmos, compreendemos).

Em determinado momento, com razão, o Focca se recorda de conversa que tivemos, anos atrás, sobre ser [ou não] sambista, na qual eu dizia não me considerar um [e não me considero ainda hoje, como não me considerarei quando, enfim, cantar pra subir], a despeito de só ouvir samba, de conhecer samba, de freqüentar o samba, d´admirar e mesmo idolatrar os sambistas - e d´experimentar a felicidade completa sempre que na quadra do Império Serrano...

Definitivamente: não é [não será] o bastante.

(E não me considero sambista, bem entendido, para muito além de não cantar, tocar ou sequer dançar o samba). (Tocasse cavaquinho como Mauro Diniz e não o seria). (Cantasse qual Roberto Ribeiro, qual Ciro Monteiro, qual Sereno - e não o seria). (Sambasse como Ubirany, como Pim - e não). (Compusesse como Paulinho da Viola - e nem assim). (Não me considero sambista simplesmente porque sei considerar quem o é).

Eu vinha de ler, então, artigo do grande Claudio Jorge - cantor de fino trato, compositor da Vila Isabel, parceiro de João Nogueira e Nei Lopes, outrora violão de Ismael Silva, hoje de Martinho -, em qu´ele, com este [resumido] currículo todo, comparando-se aos bambas com os quais convivera e convivia, apesar d´amar e viver no samba, escreveu que não era um sambista, que não se sentia um, essencialmente, que não vivia só do samba e não o tempo inteiro, qu´o samba não lhe era ar, que não esteve sempre ligado ao samba, que não nasceu no samba etc.. Eu achei aquilo tão bonito, tão honesto, tão humilde, tão severo... Tão verdadeiro. E isto porque, ao mesmo tempo, se considero Claudio Jorge um sambista, sim, entendo qu´ele não se considere.

Ser e se dizer sambista é coisa séria para quem conhece um. E para tanto sempre faltará... Quem já esteve numa roda de samba com Jovelina, com Zeca Pagodinho, com Wilson Moreira, com Dona Ivone, com Xangô da Mangueira, com Jair do Cavaquinho, quem já viu tocar Gordinho, Ovídeo, Wilson das Neves, Esguleba, Arlindo Cruz - quem já ouviu, sabe... Há um laguidibá invisível no pescoço do sambista - e laguidibá, o mistério, é colar de firmamento. (Não d´ornamento).

Ser sambista, este valor absoluto, esta presença incontornável, não comporta poréns, senões, parênteses. Não se tira - nem se quer - férias de. Não é moda. (Embora não faltem laguidibás, bem visíveis, nos pescoços por aí)... Não é capricho. Não é profissão. Não é prazer de final de semana. Não é carnaval uma vez por ano ou fora d´época. Não é de morro. Não é de preto. Não é de curimba. É definitivo, como o sangue. É corrente, como o rio. É o que fala mais alto - e não somente: é o que fala mais alto e se assume. Sou. É o que se segue. É brotado mais que nascido. É andar à vontade, mas numa pisada certa. É chegar chegado. É reverência mais que saudade. É referência. É guia. É quilombo de [para] si mesmo e é encontro de quilombolas - num sonho ou lá em Acari...

Quanto mais se vive o samba e, d´algum jeito, quanto mais se o compreende, mais modestamente se valoriza o próprio espaço, o privilégio de poder ouvi-lo, conhecê-lo - e mais profundamente se respeita o lugar dum Candeia.


[Claudio Jorge, à direira, ao lado de Luiz Carlos da Vila; e lá em cima, capa do Axé, de Candeia, o mais importante disco de samba].

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Leia a resenha tribuneira para o mais novo disco de Maria Rita - Samba meu - no glorioso e tradicional site da Casa.

21.9.07

Alimentando os 5000

Este blogue - jovem, porém maduro - não completou ainda três meses d´existência, mas vem de receber, diretamente de Fortaleza [CE], imaginamos que lá das dunas do Cumbuco, a visita de número 5000.

A Casa Tribuneira, obrigado, obrigado!, em festa pelos quatro anos de vida da matriz, comemora também o sucesso - está no sangue, não tem jeito - desta tão arteira filial.

(Acima, Jesus alimenta os 5000, de Gustave Doré, 1832-83).

19.9.07

Império Serrano - aniversário de Arlindo Cruz



Todos os galos cantaram, todas as cabrochas sambaram, todas as crianças brincaram...

Madureira chorou de alegria com a feijoada em homenagem aos 49 anos de Arlindo Cruz, no último sábado, dia 15 de setembro.

O vídeo acima eu trouxe da Serrinha, com os cumprimentos da nossa presidente de ala, Dona Marly, para que Carlos Andreazza, ausente por motivos de força maior, jamais esqueça onde é o seu lugar.

("Esperança de um mundo melhor/E cerveja pra comemorar")...

Nele - o vídeo -, Arlindo, seu filho Arlindinho e Maurição encerram a festa cantando o samba-enredo de 2007 ("Ser diferente é normal"...) acompanhados pela gloriosa bateria nota 10 de Mestre Átila (aqui sob comando de seus auxiliares) e também da rainha Quitéria Chagas, que, apesar de cada vez mais global, ainda sabe como poucas balançar as cadeiras dentro do compasso.

Gabrielzinho do Irajá, Andréia Café, Marcelinho Moreira, Xande de Pilares, Leandro Sapucahy e, claro, Jorginho do Império também deram suas canjas.

Perci, presidente da minha verde e rosa, me chamou de casaca, mas tudo bem: uma escola em cada grupo, eu disse... Todas as gerações do samba estavam presentes na quadra imperiana.

“Eu quero ver/O amor florescer/Ser diferente é normal/E o Império taí/Pra levantar seu astral/Se liga no meu carnaval”...

Obrigado, C.A.!

18.9.07

Em breve, no BG...

O boné militar verde de Fidel Castro - mas com a estrela vermelha, ausente da foto maior - virou moda entre os cubanos. Há sujinhos de todas as idades gastando US$ 3,50 (cerca de R$ 7) - quase o salário semanal da rapaziada - nas feirinhas hippies e hypes da sonífera ilha.

Maradona já ganhou um autografado. Garcia Márquez e companhia avermelhada já devem ter uma coleção em casa.

O verão do Baixo Gávea promete... Será que a boina vermelha de Hugo Chávez chega a tempo?

["É a rebeldia Posto 9, a rebeldia Baixo Gávea... Uma rebeldia que se veste de Bob Marley, Raul Seixas, Che Guevara, e assim se crê insubordinável e atuante, como se um motoqueiro guitarrista fumando maconha, desenhado numa cueca, tivesse algum valor revolucionário". (Felipe Moura Brasil; Carta pela rebeldia, 26/04/2007 - leia mais em http://www.tribuneiros.com/)].

Que assim seja...

(...)"Fim de semana eu viro batuqueira
Pego meu pandeiro
Vou pra Madureira
Pro meu glorioso Império Serrano
Que vai ganhar e subir este ano"(...)




["Corpitcho", Ronaldo Barcellos/Picolé - no novo e bom disco, Samba meu, da Maria Rita].

17.9.07

Luto em verde-e-rosa

Mestre Russo
1963-2007

"Em Mangueira
Quando morre um poeta
Todos choram
Vivo tranqüilo em Mangueira porque
Sei que alguém há de chorar
Quando eu morrer

Mas o pranto em Mangueira é tão diferente
É um pranto sem lenço que alegra a gente
Hei de ter um alguém pra chorar por mim
Através de um pandeiro e de um tamborim"

[Pranto de poeta; Guilherme de Brito/Nelson Cavaquinho]

Para sair do fundo do poço...


Não adianta: só com inteligência.

Alan Kardec salva o Fla de derrota...

Se no 11 x 11 já é quase impossível o Flamengo perder para o Vasco, imagine, então, com a ajuda dos espíritos rubro-negros?

Não entendeu? Aqui.

14.9.07

Nunca mais ouvi falar de amor...


Ele - minha religião - completou quinta-feira 49 anos.

Obrigado, Arlindo. Por todos os pagodes.

Saudade

Pedro de Lara
1925-2007

13.9.07

O sucesso póstumo

As Galerias Swann vão leiloar um manuscrito de Ernest Hemingway (Por quem os sinos dobram, de 1940, passado na Guerra Civil Espanhola) por US$ 125 mil.

Por essas e outras que eu guardo - muito bem guardados - os papéis de mesa do Jobi, onde o Andreazza, como se sabe, rascunha suas melhores obras.

Não saem por menos de 125 mil. Quem vai?

Bondinho funerário

Este é o novo bondinho do Pão de Açúcar. Mas o leitor, por favor, não se empolgue em usá-lo - e muito pelo contrário. Afinal, ele foi adquirido acaso algum incauto vá a um show, sei lá, do Nando Reis no Morro da Urca e não resista...

É o bondinho funerário.

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Leia Epifania - algumas linhas sobre o amor, de João Paulo Duarte, e redescubra o romantismo que há em você - lá no frondoso site da Casa.

12.9.07

Império Serrano 2008 [3]

Eu listara, a 3 de setembro, dois bons concorrentes a samba-enredo do Império Serrano para o carnaval de 2008 - as parceiras encabeçadas por Arlindo Cruz [n.15] e Marcão [n.26].

Um terceiro, porém, muito bom também, a correr por fora, vem crescendo na quadra, prenunciando uma final emocionante para o mês de outubro.

Trata-se da parceria de Gilberto Russo, Jari Libânia, Cupido, Moacyr e Almeida - n.13.

O leitor-folião, se puder, por favor, diga-me o que pensa dele.

O chefe se distraiu?

Os ingleses “perdem” 233 milhões de horas de trabalho por mês em sites de relacionamento. Isso dá um prejuízo de mais de US$ 260 milhões por dia. Os chefes já estão prontos para dar palmada nos funcionários.

Confira os sites mais visitados:

Facebook – 7 milhões de horas

Myspace – 5 milhões de horas

Orkut – 1 milhão de horas

Tribuneiros.com – 220 milhões de horas

[Sobre a proibição de acesso a estes sites no trabalho, leia a crônica "O chefe se distraiu?" em http://www.tribuneiros.com/ - e encaminhe para seu chefe].

Já rezava o slogan da Casa: "O chefe se distraiu? Leia os Tribuneiros...".

11.9.07

Reflexões literárias

Marcel Proust passou quase que a vida toda na cama. Não foram poucos os dias seguidos, às vezes semanas inteiras, em que restou perfeitamente imóvel, deitado, lutando para respirar. Era asmático. Por causa disso, raramente saía de casa, e apenas depois da meia-noite, quando a poeira do dia já se assentara.

(Proust e James Joyce estiveram juntos uma vez). (Chegaram mesmo a dividir um táxi). (Trocaram mal uma palavra). (A literatura viajava, ali, inteira, de táxi - e não se reconhecia). (Ou será justamente o contrário)? (Para um esboço biográfico de M.P. - do que, advirto, não se trata esta peça -, é informação [questão] tentadora). (Ao grande escritor, afinal, o diálogo, a conversa, a troca de idéias, para muito além do vulgar, fosse com Joyce ou com joão, era, indistintamente, algo como um golpe contra a mente, o pensamento, a reflexão). (A Marcel Proust, para quem só a paixão e o sofrimento afiavam os poderes da observação, a única palavra a ter algum valor era a escrita).

Amizades, se as tinha, eram secundárias e casuais. Poderoso observador, da sociedade, da aristocracia, que freqüentava menos do que se crê, valia-se por fonte. Assim, nela, acumulava desafetos. Com sorte, desconfianças. Era escritor – incondicionalmente.

Bem cedo, por saúde e vocação, conformou-se à solidão – mas o pulmão precário e a invalidez progressiva, se lhe tiraram a vida aos 51 anos, também lhe ensejaram a desculpa definitiva para, vivendo, manter as gentes ao largo quando quisesse ler e escrever. E ele sempre queria, excessiva e obsessivamente.

Para a literatura universal, a asma de Marcel Proust foi mais importante que todas as linhas escritas no Brasil – até o advento de Felipe Moura Brasil*, o nosso redentor.

* curiosamente, autor da Crônica de enfermidade [15/08/2007], disponível no arquivo de textos do glorioso site desta Casa.

Quando as aparências não enganam

Deu em O Globo Online:

"A nadadora Rebeca Gusmão está sob suspeita de doping".

E eu perguntaria: jura?

Mas não pergunto... Apenas, e porque acredito na força do amor, lembro ao leitor o que escrevi nas Notas Pan-Americanas VI, a 18 de julho último, sob o título "O poder do coração" - aqui.

Em tempo: os exames de Rebeca, anteriores ao Pan do Rio, teriam apresentado índices anormais de testosterona. A Federação Internacional de Natação [Fina] avalia o caso em sigilo.

Ao lado, foto da nadadora, digamos, menos forte, nos jogos Pan-Americanos de 2003, em Santo Domingo, República Dominicana.

(E não, leitor, não é outra pessoa).

(Por favor, não seja maledicente)...

10.9.07

Escritores ao entardecer - a série [I]

Carta ao Dr. Edmundo de Magalhães, oftalmologista - maio de 1890:

"Sou o cadáver representante de um nome que teve alguma reputação gloriosa neste país [Portugal], durante quarenta anos de trabalho. Chamo-me Camilo Castelo Branco e estou cego. Ainda há quinze dias podia ver cingir-se a um dedo das minha mãos uma flama escarlate. Depois sobreveio uma forte oftalmia que me alastrou as córneas de tarjas sanguíneas. Há poucas horas ouvi ler, no Comércio do Porto, o nome de V. Exa.. Senti n´alma uma extraordinária vibração de esperança. Poderá V. Exa. salvar-me? Se eu pudesse, se uma quase paralisia me não tivesse acorrentado a uma cadeira, iria procurá-lo. Não posso. Mas poderá V. Exa. dizer-me o que pensar dessa irrupção sanguínea nos olhos em que não havia até agora uma gota de sangue? Digne-se V. Exa. perdoar à infelicidade estas perguntas feitas por um homem que não conhece".



Camilo Castelo Branco [1825-junho de 1890].

Já nas bancas...

Uma das manchetes da [sempre surpreendente] revista Contigo, "a revista das celebridades": "Tony Ramos confessa que é uma pessoa comum e odeia a soberba".

Assumir uma cousa dessas, num veículo desses... Só mesmo um artista de ponta. Ainda assim: que coragem, não?

Confissão é isto aí.



(Nota de rodapé: mérito todo para os editores da revista, que souberam destacar esta revelação altamente jornalística).

6.9.07

Uma estranha loucura

Depois de registrar, em seu último disco, uma canção medíocre do traficante Tuchinha [que disputa até samba-enredo na Mangueira, escola do morro onde comanda a "transação"], a cantora Alcione, esta grande voz, lamentou ontem, durante gravação de CD ao vivo, a ausência dos contraventores do bicho Aílton Guimarães Jorge [vulgo Capitão Guimarães] e Aniz Abraão David [o Anísio da Beija-Flor] na platéia, para os quais pediu aplausos. (Sendo prontamente atendida)...

O local não poderia ser mais propício, não para a gravação, decerto, mas para a homenagem: a Cidade do Samba, construída pelo município e d´administração entregue - vergonhosamente - pelo alcaide Cesar "O Generoso" Maia à cúpula da bandidagem com lavanderias carnavalescas, que atende por Liesa.

Aílton Guimarães Jorge e Aniz Abraão David estão presos. E a lista de crimes pelos quais respondem, ouso escrever, não daria enredo nem na engenhosa Beija-Flor.

4.9.07

A grandeza que humilha


No dia 22 de maio de 1970, o jornal O Globo publicava mais um capítulo de As Confissões de Nelson Rodrigues:


1- Ao voltar, certo dia, do Jockey Club, Calígula chama os seus conselheiros: “Descobri que o Senado Romano não chega aos pés do Velho Senado de Machado de Assis". Os presentes, num coro afiadíssimo, disseram: “Não chega aos pés do Velho Senado de Machado de Assis"? Continua Calígula: "E por que? Por que"? Calígula dá um murro na mesa: “Vocês não sabem”?

2- Nenhum dos presentes sabia, nem desconfiava. Calígula os descompôs de alto a baixo: “Imbecis! Imbecis"! E explicou, enojado de ignorância tamanha: “O Senado Romano não anda, porque não tem um cavalo”! Os conselheiros começaram a berrar: “Falta um cavalo! Falta um cavalo"! E, então, depois de beber uma taça de vinho raro e translúcido, Calígula resolve abrir um concurso de cavalos para o Senado.

3- E assim se fez. No dia seguinte, inscreveram-se uns trinta mil cavalos, todos puro-sangue. O próprio Calígula pôs-se a interrogar os candidatos. Diga-se de passagem que os concorrentes só tinham que responder a uma pergunta, que era a seguinte: “O que é a Política”? Os cavalos não sabiam responder. Como no “Céu é o Limite”, tinham um prazo de trinta segundos. Eis a dura verdade: ninguém, ali, sabia o que era Política. E os reprovados escouceavam de impotência e frustração.

4- Finalmente, restou um único cavalo. Ofegante, Calígula repete a pergunta: “O que é a Política”? O candidato respondeu na hora: “A Política é a arte de não fazer restrição”. Ou, se bem o interpreto, a arte de não fazer nada, nem restrição. Calígula pulou. Com uma inflexão, tomada de empréstimo ao J. Silvestre, bradou: “Absolutamente certo”! A imprensa nacional e estrangeira avançou para o vencedor: “Mas o que V. Exa. quis dizer”?

5- Dirão vocês que a profundeza do nobre animal era dessas que uma formiguinha atravesse, a pé, com água pelas canelas. Mas o que o vulgo não sabe é o seguinte: vários colegas meus afogam-se exatamente com água pelas canelas. E, então, com delicada ironia, disse o cavalo: “Não fazer nada é não fazer nada”. O correspondente do Life insistiu: “Mas um senado deve satisfações ao seu eleitorado”. O cavalo pensou: “Que animais”! Relinchou: “Vejam o meu caso: eu não vou fazer nada”. Foi aí que o enviado especial do Paris-Match mandou por escrito a pergunta: "V. Exa. não pretende nem tapar cano furado”? Resposta: “Nem cano furado”.

6- O belíssimo animal, vencedor de vários Sweepstakes, tomou posse no dia seguinte. O Senado o aplaudiu de pé, como se aplaude um tenor italiano. Das galerias lotadas, choviam papel picado, listas telefônicas. Resta dizer que o novel Senador passou a chamar-se, por sugestão de Haroldo Barbosa, Incitatus. Foi considerado a maior figura do Senado Romano, em todos os tempos, porque jamais tapou um cano furado, jamais consertou uma bica entupida. Certa vez, faltou água no chafariz da Praça da Bandeira. E quanto pediram a Incitatus, a respeito de tal seca, um parecer, retrucou: “Ah, falta água. Azar”! Resposta, como se vê, que Maria Antonieta assinaria.

7- Dirá algum fanático da verossimilhança, algum maníaco da veracidade histórica, algum idiota da objetividade, que acabei de tecer uma fantasia irresponsável. Nem tanto, nem tanto. Diria eu que o importante é não fazer. O sujeito que faz, simplesmente faz, arrisca-se ao infinito. Pouco depois da República, morreu um ministro da Agricultura. Não sei por que cruel fatalidade, os sucessivos ministros da Agricultura passaram a não fazer nada, absolutamente nada. Mas volto ao cemitério. Até o presidente da República compareceu. Era em 1902, ou seria 108, sei lá. E quando o quinto orador já limpava um imaginário pigarro, Além se antecipou.

8- Era um bêbado. Mas como já dizendo, o pau-d’água começou a soluçar: “Este grande homem, que todo o Brasil chora”. Arqueja e continua: “Ministro da Agricultura, nunca plantou um pé de alface, nunca plantou um pé de couve, nunca plantou uma melancia”. Era verdade. E por que o ilustre não fizera nada, nem isso, a nação, agradecida, embrulhou seu caixão na bandeira nacional. Sua ociosidade teve, assim, uma apoteose fúnebre nunca vista.

9- Bem. Tudo o que ficou dito atrás é uma introdução a Mario Andreazza, o Ministro. Faltou-lhe um amigo que soprasse o luminosíssimo conselho: “Não faça nada, não faça nada”. Aquele que faz, apenas faz, e não quer senão fazer, está desafiando as potências do destino político. A sólida maioria dos que nada fazem perdoa tudo, menos a maldita vontade de fazer.

10 – Ele está fazendo sua obra com uma obstinação fanática e suicida. A primeira vez em que ouvi seu nome foi num sarau de grã-finos. Eu estava num grupo quando alguém falou no apartamento de Andreazza. Entre parênteses, para mim não há nome intranscendente. O nome, repito, insinua um vaticínio. Ninguém se chama Andreazza por acaso.

11- Quem não compra um apartamento? E, se não compra, quem não aluga um apartamento? Todos moramos em apartamentos alugados ou comprados. Todavia, no presente caso, o apartamento, por se tratar de Andreazza, mereceu uma inflexão especialíssima ou, melhor dizendo, uma inflexão vil. E o fato é que um puxou o assunto e os outros o trataram, com frívola e jucunda ferocidade.

12- E, então, pensei: “Esse homem deve estar fazendo muito". Foi a primeira intuição que me ocorreu e maravilhosamente certa. Mas quis eu conhecer a história e a lenda de tal apartamento. Perguntam: “Mas você não sabe”? Para minha vergonha e humilhação, não sabia. E, então, uns dois ou três incumbiram-se de descrever a residência do Ministro. Paredes de mármore, chão de mármore, bicas de ouro. O mais modesto tapete de Andreazza custava uma fortuna. O lustre, mesmo apagado, estilhaçava diamantes. Piscina suspensa, com crocodilos deslizando, sem marola. Numa pequena sala, havia uma cascata artificial, com filhotes de jacaré, etc. etc..

13- No fim, eu já imaginava que o morador do prodigioso apartamento era, não o Andreazza, mas o rei da Arábia Saudita. Os sujeitos me juraram: "Vai lá, rapaz, vai lá”. Não acreditei, e o confesso, em nada. Disse eu: “Esse homem não é isso”. Ninguém ignora que, no Brasil, a glória é uma pirâmide de injúrias, de insultos, de palavrões. Só poupamos a mediocridade provadamente estéril. Eu poderia citar cem exemplos. Um deles seria o de Oswaldo Cruz. Lá fora, o simples nome do Brasil bastava para exalar a febre amarela, a peste bubônica, a varíola. Todos os dias, o brasileiro morreria das pestes citadas. Aconteceu então o seguinte: a imprensa abriu uma feroz campanha contra Oswaldo Cruz e a favor da febre amarela, contra Oswaldo Cruz e a favor da peste bubônica, contra Oswaldo Cruz e a favor da varíola. No fundo o que se queria era um Incitatus na Saúde Pública.

14- Volto a Mario Andreazza. Tratei de saber quem era ele, como era ele. Em primeiro lugar, o seu apartamento, como o descrevem, é uma fantasia muito cínica. Nunca existiu. Os colegas Francisco Pedro do Couto e Armando Santos, interrogados por mim, deram-me ainda ontem vários dados concretos, inclusive este: Juscelino fez 2.500 quilômetros de asfalto. Andreazza: 5.500 quilômetros. Até fins de 70, Andreazza chegará aos 10 mil. Não há duvida possível, nem sofisma: é uma obra gigantesca. Um homem desses está ajudando a fazer o Brasil. Muitos dizem: "É um louco, é um louco”! Outros, fingindo simpatia e boa fé, baixam a voz: “O Andreazza está exagerando. É demais, é demais”! Quanto ao apartamento, é desses que qualquer um de nós, qualquer brasileiro da boa e abnegada classe média, pode alugar, comprar, morar, etc. etc..

15- Homens assim têm uma vocação de grandeza que humilha e ofende os demais.


[Nelson Rodrigues; "Um brasileiro chamado Andreazza", em: As confissões de Nelson Rodrigues, 22/05/1970].

3.9.07

Império Serrano 2008 [2]















Já são conhecidos os 27 concorrentes a samba-enredo do Império Serrano para o carnaval de 2008 - e todos podem ser ouvidos no site da escola.

Depois d´escutá-los [várias e várias vezes] ao longo do final de semana, escolhi os dois melhores - bons mesmo - e estou certo de que o Império cantará um deles no ano que vem.

Sem antecipar a minha preferência - até porque ainda não segura -, peço aos tribuneiros de boa vontade qu´os escutem e nos digam aqui, se assim puderem, qual deles gostou mais, ou se mesmo entre os outros 25 cá não destacados há algum digno d´especial atenção.

Parceria [n. 15] de Arlindo Cruz, Aloísio Machado, Maurição, Carlos Senna e João Bosco - ouça.

Parceria [n.26] de Marcão da Serrinha, Marcelo Ramos, Vando Diniz, Chupeta, Henrique Hoffmann, William Black, Celso Ribeiro e Zé Paulo - ouça.

O samba-enredo preferido pelos leitores tribuneiros será aquele pelo qual a Casa fará campanha.

Obrigado e... Avante, imperianos!