30.6.07

O melhor do cinema recente em espanhol

Sempre me ligam para perguntar "Que filme eu alugo?", "Que livro eu compro?", "Que CD eu dou de presente?". Agora já posso dizer: "Leia em Tribuneiros - o blogue".

Selecionei 24 filmes – homenagem clara ao Foca – de língua espanhola, todos ótimos para o fim de semana, e comentei-os brevemente. Ah, se o cinema brasileiro nos desse tantas alegrias...


Nueve reinas (ARG, 2000) – Como dois trapaceiros aplicando golpes baratos em Buenos Aires, Ricardo Darín e Gastón Pauls podem ser menos glamourosos que George Clooney e Brad Pitt, mas, por isso mesmo, são mais malandros, mais moleques, mais geniais, mais sul-americanos e, claro, muito mais engraçados.

El mismo amor, la misma lluvia (ARG, 1999)/ El hijo de la novia (ARG, 2001)/ Luna de Avellaneda (ARG, 2004) – As três obras-primas [não-seqüenciais] do diretor Juan José Campanella, com os gênios do humor portenho Ricardo Darín e Eduardo Blanco fazendo você rir, chorar, rever, decorar e tudo mais. Meus favoritos.

El aura (ARG/FRA/ESP, 2005) – O mesmo diretor de Nueve reinas, Fabián Belinski, em mais um roteiro policial extraordinário, com Ricardo Darín em cenas memoráveis – e sérias - de ataque epilético.

Samy y yo (ARG, 2002) – Esta sim uma comédia mesmo, bem escrachada, mas não menos hilariante, porque um reality show com um Ricardo Darín desengonçado dá de mil a zero em qualquer BBB, e a musa colombiana Angie Cepeda deixa qualquer Siri no chinelo.

Iluminados por el fuego (ARG/ESP, 2005) – Um raro filme de guerra bom, bonito, humano e estarrecedor, que, ao terminar, tem o porém de encher você de vontade de saber tudo sobre a Guerra das Malvinas. Gastón Pauls, de Nueve reinas, impecável como o ex-combatente tentando apagar de uma vez seus fantasmas.

No sos vos, soy yo (ARG, 2004) – Diogo Peretti é uma espécie de Pedro Cardoso argentino. Só de olhar, já dá vontade de rir, e, na pele de um marido abandonado em crise, é gargalhada certa, não sem fortes emoções. Este filme serve para nós homens quase tanto quanto um texto da Bruna para as moças. Ah, o amor...

Tiempo de valientes (ARG, 2005) – Agora como um policial, Diogo Peretti e seu humor desesperado trazem a esta comédia cenas inesquecíveis, como a da revelação de uma infidelidade na mesa do jantar, com armas e tudo.

Pantaleón y las visitadoras (Peru, 1999) – A história, baseada na obra de Mario Vargas Llosa, já é engraçada e afrodisíaca (um militar todo metódico recebe a função de organizar uma equipe de prostitutas, entre elas a fatal Angie Cepeda, para satisfazer as tropas instaladas na selva amazônica). O filme, também.

Te doy mis ojos (ESP, 2003) – Uma pérola dramática sobre a violência doméstica, com grandes atuações – e muita porrada - de Luís Tosar e Laia Marull. Na terapia de grupo para maridos agressivos, há uma cena antológica de humor em que dois deles [Tosar e outro] simulam um casal se encontrando em casa à noite.

Los lunes al sol (ESP, 2002) – Só por ter Luís Tosar e Javier Bardem, já merece ser visto. Mas é um filme de uma simplicidade tão precisa sobre o desemprego – masculino, diga-se – que dá vontade de se meter nas conversas de bar da rapaziada. Da recessão, tiram-se humor e lirismo de sobra.

Mar adentro (ESP, 2004) – Interpretando a história verídica de Ramón Sampedro, que, após um acidente banal, fica tetraplégico, passa 28 anos preso a uma cama e luta pelo direito de morrer, Javier Bardem prova – sem exagero - que é um dos melhores atores de todos os tempos.

Amores perros (MEX, 2000) – A essa altura já clássico, o filme que consagrou o roteirista Guillermo Arriaga, o diretor Alejandro Iñárritu e o ator Gael García Bernal (mais tarde juntos em Babel) mostra a mudança na vida de três pessoas a partir de um acidente de carro. Briga de cachorro, modelo aleijada, matador de aluguel e uma porção de insanidades bem costuradas fazem dele uma aula a qualquer roteirista brasileiro.

Y tu mamá también (MEX, 2001) – Gael García e Diego Luna se aventuram pelas estradas do México com uma mulher mais velha - mais experiente, registro - que lhes apresenta um bocado de coisa... Belo, divertido e verdadeiro retrato da juventude, com todos os seus desejos.

Seres queridos (ESP/ING/POR/ARG, 2004) – Uma comédia familiar banal - espécie espanhola de Entrando numa fria - mas engraçada que só, dados os talentos da magistral Norma Aleandro, de O filho da noiva, e do boa-praça Guillermo Toledo, que trazem a um jantar de família discussões e situações fantásticas desde judeus versus palestinos até o assassinato de um pedestre.

Cleopatra (ARG, 2003) – Nada épico, não. Norma Aleandro faz uma professora aposentada que dá uma de Thelma e Louise com uma jovem e vulnerável celebridade (Natalia Oreiro), viajando para fugir da rotina. Norma Aleandro vale o filme. Há uma cena dela sozinha, chorando e rindo ao volante, que é só pra quem pode.

Valentin (ARG, 2004) – O gênio! Não há leitora que não se apaixone pelo pequeno Valentin, um menino inteligente e observador que mora com a avó, sonha em ser astronauta e em conhecer sua mãe, e acaba aprendendo piano com o vizinho louco. Uma obra-prima de leveza, humor e sensibilidade.

El otro lado de la cama (ESP, 2002) – Uma comédia musical e, por assim dizer, o único musical tolerável, pois que todo bem-humorado e sexuado, com dois casais em crise, vividos por Paz Vega, Guillermo Toledo, Natalia Verbeke e Ernesto Alterio, um quarteto da pesada em termos de entretenimento. A continuação está a caminho.

Tinta roja (PER, 2000) – Este filme devia passar nas faculdades de jornalismo. Jovem repórter vai parar na editoria policial de um jornal sensacionalista e tem que lidar com o submundo peruano. É uma delícia. Rende uma porção de situações embaraçosas, hilariantes e violentas.

Días de fútbol (ESP, 2003) – É incrível que essa comédia tenha passado batida por aqui. Um bando de homens fracassados recuperam sua alegria formando um time de pelada – de futebol soçaite mesmo – chamado – imagine você - Brasil. Eu estava em Madri quando estreou, e todos os gringos vinham me perguntar: “Já viu Días de fútbol?”. Acabei vendo. O Brasil nunca teve um time tão ruim. Mas o filme é engraçado demais.

Lucía y el sexo (ESP, 2000) – Eu me recuso a explicar este filme, a que já assisti algumas dezenas de vezes. E não porque é com a Paz Vega, ou porque é quase pornográfico, como dirá a assanhada leitora, embora também. Mas porque é brilhante, lindo, louco, idílico, insular, altamente literário, e tem um sexo no mar em noite de lua cheia que deixa a Cicarelli a ver navios. Uma cousa!

Nicotina (MEX/ARG, 2003) – Diego Luna, de Y tu mamá también, não devia nunca ter ido para Hollywood. Seus filmes mexicanos são muito melhores, e ele é muito melhor em espanhol. Aqui, Diego é um hacker que, além de espionar a vizinha nua, descobre dados sobre contas suíças e se envolve com a máfia russa. Há muito do que rir.

María llena eres de gracia (COL/EUA, 2004) – Uma obra-prima colombiana sobre o tráfico internacional de drogas a partir das mulheres encarregadas de transportar cocaína no estômago para Nova York – as “mulas” -, engolindo umas setenta cápsulas como aquela do cartaz, do tamanho de uvas gigantes. Suspense da mais alta qualidade.

29.6.07

Vote na musa tribuneira!


O leitor está convidado a participar das eleições para musa tribuneira. Basta deixar seu voto na seção de comentários abaixo.
Da etapa inicial de 1.300 concorrentes, selecionamos as 13 mais bem votadas pelo público da Casa.
Duas lembranças apenas:
1) Nós nos recusamos a colocar as mulatas para jogo. Puro ciúme.
2) Bruna Demaison em breve divulgará a lista dos musos. A leitora aguarde.

Grupo Especial será sempre aquele em que o Império Serrano desfilar

E alguém dirá que não?

(Créditos todos para a bateria "Estandarte de Ouro" do Mestre Átila).

28.6.07

"Pela Bruna, eu volto até ao Vietnã." (Rambo)

Leitor assíduo dos Tribuneiros, Sylvester Stallone fez questão de tirar uma foto com sua escritora favorita, Bruna Demaison, enviada especial da Casa à Tailândia, onde ele agora realiza as filmagens de "John Rambo", vulgo Rambo IV.

Não satisfeito - sobretudo pelo enquadramento pouco benevolente à beleza tão tipicamente brasileira da nossa mulher-maravilha - o maior gênio da arte pugilista convidou-a para o papel de heroína do episódio final da série, convite este imediatamente recusado por mim e pelo Andreazza, posto que, como se sabe, a Demaison é nossa, arrá, urru.

Drummond e a Rio-Niterói

A ponte e a barca, de Carlos Drummond de Andrade, publicada no Jornal da Tarde a 7 de março de 1974 - e, pérola que é, presente na coletânea tribuneira "100 melhores crônicas brasileiras desconhecidas pelo Joaquim Ferreira dos Santos":

Bela, funcional, moderna, espetacular, fora-de-série, gastarei todos os qualificativos entusiásticos em louvor da ponte Rio-Niterói. É obra que leva o brasílio peito a enfunar-se de orgulho. Pessoalmente, estou enfunando o meu. Mas, aqui entre nós, quando me der vontade de atravessar a baía, é de barca que eu vou, oferecendo-me a gratificante sensação do périplo marítimo.

Se viver não é preciso, mas navegar é preciso, como ultimamente se vem repetindo e até cantando, ir a Niterói de lancha ou aerobarco e voltar na mesma engenhoca restitui-nos aquele status de navegantes que perdemos quando nos empenhamos nas tarefas de exploração e povoamento do solo americano. Éramos navegadores, éramos nômades, e o mar constituía nosso chão de terra móvel. A barquinha da Guanabara constitui o último resquício dessa identificação com o mar-oceano, para nós, os despojados netos do “ilustre Gama”. A gente vai lá e volta no mesmo dia, mas consola-se de não ter feito a viagem das índias. E eu vou perder uma emoção dessas?

Para mim, a vantagem da grande ponte é exatamente esta: valoriza o trajeto clássico sobre as ondas. Pode parecer gosto de valsa vienense. Juro que não é. A carga pesada passa por aquela maravilha de concreto e tecnologia, os carros já não necessitam de barcaças para serem transportados de uma a outra cidade. Assim, diminui o movimento na baía, as águas lamberão com mais interesse e melhor ritmo o casco de nossos batéis dedicados ao serviço da aventura humana em sua forma discreta, mas plena de evocações místicas – salve, Netuno! Salve, Superintendência dos Transportes da Baía de Guanabara! Tua sigla STBG não está nos Lusíadas, o que não impede que, passageiro de uma de tuas nove embarcações eu me invista nas transas camonianas de largo espectro, e até mesmo nas espantosas complicações de Odisseu, em suas “nave côncava”, de regresso a Ítaca. E tudo tão barato – sem pedágio, sem sinalização sofisticada, sem os rocamboles da regulamentação severa que presidirá ao uso da ponte.

Ai de mim, que antiquado sou. Admiro a ponte e cultivo a barca. Também sinto saudades do trem-de-ferro, parcialmente derrotado pelas pontes aéreas, e saudades cruciantes do cavalo manso que foi meu veículo exclusivo em antigos percursos serra-acima serra-abaixo. Dispusesse eu de um cavalo castanho para ir à redação entregar minha matéria três vezes por semana, e me fosse permitido montá-lo pelas ex-ruas da cidade, hoje pistas de rolamento, vê lá se os táxis me tinham como cliente. Bicicleta? Seria recusada. O bom e nobre cavalo, menos servo do que companheiro, prudente e forte, disciplinando-se menos pelas rédeas do que por seu próprio senso e experiência imemorial, é que me conduziria pelos caminhos urbanos (se ainda existissem). Sei que estou sonhando. Pelo menos assim recomponho a unidade homem-animal, que durante séculos deu vida à paisagem brasileira, e hoje é mero divertimento de uns raros amadores, ou matéria de apostas.

Riem de mim, por ser antiquado? Sou do tempo de certos prazeres hoje quase desconhecidos. O de andar, por exemplo. Quem anda mais? Estamos sempre correndo ou fugindo de algum perigo institucionalizado. Correndo ou sendo conduzidos por um instrumento corredor. Nossas pernas vão-se tornando dispensáveis, à medida em que rodas e motores se encarregam de levar-nos. A delícia de parar, depois da caminhada; ou num intervalo dela, já não é delícia, mas frustração, no tráfego congestionado. Tais prazeres simplíssimos, mas sem preço, foram-nos subtraídos pelo progresso, conquistado ao preço de suaves comodidades. Como ele é incômodo! E, pior de tudo, essencial à vida, de modo que, sem ele, era uma vez a vida.

Fito a soberba obra de engenharia, destinada à circulação de máquinas (e de homens dentro de máquinas), vedada ao uso direto e pessoal do homem, por exigência do próprio avanço do homem. Linda, linda. Estou orgulhoso. Mas vou de barca, desculpem.

Carlos Lamarca

Carlos Lamarca em sua melhor forma "Rambo".

27.6.07

Homenagem ao fundador

Este blogue não poderia içar velas sem, antes, exibir - covardemente - a fuça assaz barbuda de Rafael Simi, o Focca, fundador da Casa e força de permanência dum jornalismo que, apesar dos pesares, ainda é possível, qual seja, o de qualidade.

(Nota de rodapé: os verdes olhos, naturalmente, eu os criei no photoshop).